Queda para o alto
 
 
Bahia lidera ranking de pessoas que sofrem acidentes no ambiente de trabalho, muitos fatais
 
     
 
Vanessa Barbosa e Raíza Rocha
Da equipe de reportagem
 
     
 
 
Raíza Rocha
 
 
 
 
Canteiro de obras na Praça Castro Alves, centro de Salvador
 
 
     
 

Marinilton da Silva, 38, afastado do serviço por acidente de trabalho, trabalhou na empresa P. A. Arquivos sem carteira assinada por um ano. Não havia equipamentos de proteção e profissionais da área de segurança do trabalho. No dia 16 de março de 2005, essa relação trabalhista ilegal foi interrompida. O trabalhador subia, como de costume, numa escada “remendada” para pegar caixas, quando se desequilibrou e caiu de 9 metros de altura. Sofreu lesão medular, ficando impossibilitado de movimentar os membros inferiores do corpo.

Há um ano o trabalhador move uma ação indenizatória contra a empresa. Aguarda o ressarcimento por danos morais e materiais. “Esse acidente transtornou a nossa vida, nada pode pagar a agonia em que vivemos”, declara Ana Cristina, 32, comerciária, mulher de Marinilton. Queda, queimadura, mutilação, choque elétrico, soterramento. Acidente de trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte do trabalhador ou redução, permanente ou temporária, de sua capacidade para o trabalho.

A Bahia é o Estado brasileiro em que são notificados mais acidentes de trabalho. Doenças ocupacionais e acidentes ocorridos no trajeto até a empresa também são considerados acidentes de trabalho legalmente. Em 2005, foram registrados 20,5 casos a cada 10 mil trabalhadores, de acordo com dados da Previdência Social. Enquanto a média nacional foi de 12 ocorrências. Em 2007, já foram notificados 10 acidentes com óbitos, segundo o Centro de Estudos de Saúde do Trabalhador (CESAT), órgão ligado à Secretaria de Saúde do Estado, responsável pela vigilância, fiscalização e assistência aos trabalhadores na área da saúde.

Esses números, embora alarmantes, são parciais, pois representam apenas as solicitações de benefícios relacionados a acidentes de trabalho ao INSS. Os casos envolvendo empregados domésticos e autônomos não entram nas estatísticas, porque eles não têm direito a benefícios desse tipo. Além disso, muitas vezes, doenças ocupacionais são “diagnosticadas” como doenças comuns por médicos das empresas ou indicados por ela. Segundo Maurício de Macedo, chefe de Inspeção do Trabalho da DRT (Delegacia Regional do Trabalho) na Bahia, esses médicos tendem a não apontar doenças relativas ao trabalho. Evitando que seja concedido ao trabalhador o auxílio-doença acidentário que garante a continuidade do depósito do FGTS durante seu afastamento e impede sua demissão por um ano após o retorno à empresa.

Acidentes são previsíveis, diz especialista

Segundo professor e técnico de segurança do trabalho, Paulo Rios, todo acidente de trabalho pode ter suas causas previamente levantadas. Isto é, eles não acontecem inesperadamente ou de forma inevitável. “Os acontecimentos são incontroláveis e naturais, os acidentes não”, esclarece. Para Alexandre José Ribeiro, coordenador do CESAT, o acidente demonstra que o sistema de risco da empresa não está funcionando. Mas os empresários tenderiam a culpar o trabalhador. Definindo o acidente como resultado de um ato inseguro ou imprudente.

Perisvaldo Evangelista, subsecretário do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção e da Madeira, defende ser insuficiente dar os EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) aos funcionários. Seria preciso também possibilitar o acesso do trabalhador a áreas de lazer, boa alimentação e salário digno. Pois esses fatores também contribuem para evitar acidentes de trabalho. Jornada de trabalho intensa, pressão para entrega da obra, dificuldades financeiras, falta de equipamentos de segurança ou de orientação sobre como utilizá-los são fatores que fazem da construção civil o setor onde ocorrem mais acidentes segundo Evangelista. Só nos primeiros meses de 2007, já foram 11 acidentes com três óbitos nesse segmento.

É atribuição da DRT fiscalizar o cumprimento das normas de segurança e medicina do trabalho nas empresas. Determinando as obras e reparos necessários ao local de trabalho e impondo penalidades se as modificações não forem feitas. No entanto, a demanda de fiscalização excede à capacidade do efetivo formado por 36 auditores em todo estado da Bahia. Muitas empresas levam anos sem inspeção. Para eliminar obrigações decorrentes da relação de emprego, inclusive as referentes à saúde do trabalhador, algumas empresas se valem de institutos que atendem a outras finalidades como estágios e prestação de serviços de cooperativas.

Para o chefe de inspeção, Maurício Macedo, todo processo de terceirização leva a uma precariedade das relações trabalhistas. Nesse sentido, a Emenda 3 seria uma institucionalização dessa prática ilegal segundo ele. Alexandre Ribeiro concorda com essa perspectiva. “Se ocorrer um acidente, o trabalhador não vai ser considerado um funcionário da empresa, mas um prestador de serviços. Ele passa a ser um autônomo e não vai ter mais direito, dentre outras coisas, ao seguro-acidentário”, explica.

 
     
 
 

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