Eterno corre-corre
 
 
A exemplo de outras capitais brasileiras, em Salvador briga de ambulantes e Prefeitura vira novela
 
     
 
Gilvan Reis e Humberto Saldanha
Da equipe de reportagem
 
     
 
 
Humberto Saldanha
 
 
 
 
Barracas de venderoes ambulantes nas imediações da Lapa, maior estação de ônibus de Salvador
 
 
     
 

Trabalhando há seis anos em Salvador e sobrevivendo com a venda de CD’s e DVD’s piratas, Carlos Texeira, 32, faz parte de um grupo característico do centro da cidade, os vendedores ambulantes. Por todos os lugares se encontram pessoas, em sua maioria desempregadas, que buscam no comércio informal uma alternativa para sobreviver, vendendo coisas variadas, desde roupas íntimas até acarajés. Apesar desse cenário já fazer parte do cotidiano, ainda surpreende o fato das relações entre ambulantes e Secretária de Serviços Público (Sesp) /Fiscalização permanecerem conflituosas. “Eles já me bateram algumas vezes e já apontaram uma arma também. Eles não têm pena de ninguém”, denuncia Texeira.

Luís Artur Silva, 34, Fiscal da Sesp, diz que é orientado para agir de forma pacífica, mas admite que, às vezes, podem acontecer alguns contratempos. “Nós devemos agir de modo passivo. Não desminto que haja violência em nossa ação. Isso vai depender muito da reação de cada um, tanto do fiscal, como do camelô. Às vezes rola stress, rola confronto, aí né?”. Para solucionar essa questão, a Prefeitura vem, desde 1998, realizando cadastros. Há pouco mais de um mês, uma nova ofensiva para registrar os camelôs foi feita. Não deu certo. Isso porque a Sesp, órgão municipal que fiscaliza e apreende os produtos, não dá licença para a comercialização de DVD’s e CD’s piratas, justamente a maior fonte de lucro para os trabalhadores informais.

É o caso de Jamile Pereira, 21 anos. Ela trabalha há três anos na informalidade. Sua barraca é registrada pela prefeitura e ela paga um taxa de 122 reais, parcelada em duas vezes. Sua licença era para vender brinquedos, mas Jamile passou a vender Cds e DVD’s piratas: “São mais baratos que os brinquedos e todo mundo compra”, acrescenta.“Depois que comecei a vender esse outro produto, a fiscalização me disse que era para parar de comercializá-lo, porque eram ilegais e me ameaçaram dizendo que se me vissem de novo iam apreender a mercadoria”. Já o fizeram por três vezes.

A licença e o cumprimento das exigências podem ser obtidos na Sesp. De acordo com Cintia Conceição, chefe do departamento de licenciamento do órgão, o solicitante deve preencher um requerimento com os seus dados, o que pretende comercializar e indicar o local onde planeja estabelecer seu ponto de venda. “Se tudo estiver nos conformes, a Sesp libera a licença em até trinta dias”. A lei que rege o mercado informal, em Salvador, foi outorgada em 1998, na gestão do prefeito Antônio Imbassahy. Mas a legislação já é ultrapassada. “Já foram sugeridas algumas mudanças, já participei de reuniões que visavam discutir quais os tipos de modificações que a lei deveria sofrer. Ainda não se chegou a um consenso e enquanto nada é feito, a lei é adaptada à nossa realidade”, diz Cíntia Conceição.

Caos no Centro

Enquanto a legislação não avança, o caos no centro da cidade continua. Dezenas de camelôs se amontoam nas calçadas e, em alguns lugares, nas próprias pistas, impossibilitando o tráfego de pedestres e de carros. Victor Vaqueiro de Lima, 19 anos, estudante da Universidade Católica, campus da Lapa, reclama do transtorno e da falta de uma fiscalização mais rígida. “Muitas vezes o pedestre é forçado a andar na rua pelo fato da calçada estar completamente ocupada por produtos dos camelôs. A fiscalização deveria controlar o fluxo de produtos piratas. A fiscalização tem que ser feita de forma profissional e sem violência”, afirma.

O estudante diz que ocasionalmente faz compras nos ambulantes e acredita que “uma solução seria delimitar definitivamente o local de venda dos ambulantes, regiões específicas para a concentração dessa atividade”. A proposta de reformar o centro da cidade e transformar a Avenida Sete numa espécie de Rua 25 de Março (de São Paulo) está engavetada.

Antônio Souza, 42, tem uma década vendendo relógios, diz que foi agredido e expulso do Campo Grande, pela fiscalização. “Xingaram meu filho, me ameaçaram e me bateram”. Ele buscou refúgio na Lapa, mas continua insistindo que os fiscais são despreparados: “Eu mereço um tratamento humano, deveria haver respeito, não sou vagabundo e trabalho para sustentar minha família”. O mesmo fiscal da Sesp, Luiz Artur, acha que as agressões também partem dos camelôs. “Eu acho que a gente deveria ter apoio da Polícia Militar para evitar essas situações, porque a gente corre risco, é por isso que algumas pessoas reagem. A presença da polícia gera respeito, legalidade e a gente se sente protegido, pois eles seriam nosso escudo”.

Se a presença da polícia resolveria o problema, Carlos Texeira não sabe informar, mas afirma que apenas a presença da fiscalização já foi suficiente para diminuir sua vendagem: “Agora o comércio tá fraco. Antes eu vendia até 500 reais por mês, hoje consigo menos de 300. E tá assim por causa desse sistema que o prefeito  implantou. Aqui passa fiscal todo dia e leva o que a gente tem. Hoje meu prejuízo foi de mais de 500 reais”. Parece cena de filme (pirata, é claro), Carlos correndo do rapa e divulgando seu mais novo produto: “ Ó paí ó, eu tenho o DVD Homem Aranha 3”.

 
     
 
 

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