Estava no primeiro dia do ano em um café da Praia do Forte e vejo um rapaz que tinha saído da minha agenda. Ele se aproxima, muito sorridente, o apresento aos amigos da mesa e aperto sua mão. De repente eu e meus amigos vemos que algo cresceu na sua sunga. Não agüentei a deixa para parodiar a minha frase favorita de Mae West: “Querido, isso aí debaixo é um frasco de bronzeador ou é apenas porque você está contente em me rever?”.
O rapaz, curto e grosso, respondeu simplesmente: “É um pênis, mesmo”. Acostumado a ver aquele objeto tratado por meio de tantas metáforas, meus amigos acharam a resposta muito inapropriada para o lugar e o momento. Uma resposta dura. Sempre gostei daquele texto de Michel Foucault “As palavras e as coisas”.
Às vezes o uso da palavra certa para denominar a coisa pode evitar todo o mal-estar de uma civilização.Às vezes o contrário. Pode ser que já estejamos preparados pra chamarmos as coisas pelos seus nomes. Uma vez me pediram pra tirar a palavra “bufa” de um texto que eu tinha escrito pro jornal A Tarde. Tentei argumentar a favor do uso de tal palavra de baixo calão usando sua definição de dicionário: “Flato emitido sem estrépito”. Mas não colou. O lugar, me disseram, não era apropriado para seu uso. O conceito estava correto, mas a sua aparência em forma de signo verbal ainda causava espécie. Tirei minha bufa, afinal nem só de flatos vive o homem, e publicaram o texto.
Como o uso de algumas palavras ainda é tabu na imprensa, e na sociedade brasileira resolvi dar minha contribuição lexical e, para facilitar a vida dos jornalistas que tratam do tema, mudar o nome daquela coisa que chamam de capeta, de carvalho, entre centenas de denominações, para algo mais chique. Quando o rapaz da Praia do Forte saiu falei para os meus amigos que aquilo na verdade deveria ser chamado de PIB. Produto Interno Bruto.Tal o nível do descontrole ascensional. Se o PIB brasileiro subisse com a velocidade, e força, que sobe o PIB desses rapazes estaríamos há muito tempo no G 7. Chegou a hora do governo brasileiro pesquisar porque esse outro PIB sobe tanto e o seu só às custas de alteração de índices e parâmetros.
Parece que o maior problema do mundo, do Brasil e do jornalismo se resume ao “mot just”. Isto é, ao uso da palavra certa no lugar certo. Numa sociedade de aparências as pessoas acabam se tornando mestres em eufemismos. Como disse o mestre Jobim “É pau, é pedra...” E ás vezes um pau é apenas um pau.
Maurício Tavares, professor da Facom/UFBA, é colunista deste jornal.
E-mail: mntavares@ufba.br