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Eventualmente, o portador de um celular comprado na loja por menos de 200 reais, sem câmera, infravermelho e etc., pode até ser roubado. Mas são poucos os casos. Que o diga Luiz Carlos da Paixão, 29, detento da Delegacia de Furtos e Roubos (DFR). Paixão está ali por ter realizado um assalto a um grupo de 3 pessoas, das quais levou apenas um celular, sem câmera, de baixo valor comercial. Junto com um colega, Paixão simulou possuir uma arma, deu voz de assalto, pegou o celular da mão da vítima, saiu correndo e pulou um muro, quando então foi pego por alguns seguranças. Segundo Paixão, enquanto ele e seu parceiro eram espancados pelos seguranças, um destes desdenhou do baixo valor do aparelho: “Olha a porcaria que vocês pegaram. Se fosse uma coisa melhor a gente até soltava vocês,” relembra.
Roubar e revender celulares se tornou uma atividade fácil e lucrativa também em Salvador. Segundo Jaeclar Cavalcanti e Antonio Braga, respectivamente responsável pelas estatísticas e Coordenador do plantão na 12a delegacia, em Itapuã, 90% dos objetos roubados ou furtados na região, incluindo os bairros de São Cristóvão, Stela Mares, Paralela, e Mussurunga, correspondem a celulares. “Algumas abordagens não são especificamente para extorquir celulares, mas o aparelho acaba vindo na embolada. Mas a grande maioria é premeditada para subtrair apenas celulares”. No dia 27 de março, quando a reportagem esteve naquela delegacia, dos 11 roubos ocorridos na região 9 foram de telefones móveis. No dia 29, foram registrados 10 roubos, sendo 7 de celulares, em ações a mão armada.
A Delegacia especializada de Furtos e Roubos, localizada na região da Baixa do Fiscal, registra números maiores. São registrados ali uma média de 14 roubos e furtos de celulares ao dia, sendo que essa quantidade aumenta, sensivelmente, aos domingos. No dia 25 de março, foram registradas 23 ocorrências, 9 somente na chamada Feira do Rolo, que acontece na Baixa do Fiscal apenas aos domingos. Os registros de queixas apontam que a preferência dos ladrões, por enquanto, é o moderno aparelho celular V3. Mas, nem mesmo os aparelhos mais baratos e populares escapam.
Mulheres são vítimas fáceis para esses ladrões, pois são mais indefesas e raramente reagem. A estimativa de Ana Cláudia, representante do Setor de Estatística da DFR é de que 70% dos furtos são abordagens a mulheres. E, esse índice cresce ainda mais durante os períodos de festas populares: “a pessoa vai para se divertir e acaba não cuidando como deve dos objetos que está levando. Isso é um prato cheio para os ladrões”, comentou. Durante o Festival de Verão, chega a ocorrer um aumento de 70 a 80% no índice de queixas por roubo de aparelhos celulares na 12ª delegacia em Itapuã. E a situação é a mesma por toda Salvador durante o Carnaval, segundo Braga. Porém, é possível que essa estimativa não corresponda à realidade. As estatísticas das delegacias costumam generalizar quanto aos objetos roubados ou furtados, não especificando se o roubo ocorrido foi de baton, jóias, celulares ou etc.
Muitas pessoas que tiveram seus celulares roubados sequer dão queixa nas delegacias. “Pra quê, se nunca vai ser recuperado?! Na esquina seguinte, o ladrão joga o chip fora e revende o aparelho!”, disse Ana Santana, 22, residente de Brotas. Ana Cláudia confirma a dificuldade ou mesmo impossibilidade de recuperar um celular furtado: “depois que o chip é tirado não tem como identificar se o aparelho é roubado ou não e, mesmo sabendo que tem várias pessoas vendendo em ruas, feiras e pontos comerciais vários celulares roubados, não temos como prendê-las sem ter provas concretas. Se encarcerarmos todos os indivíduos que vendem por aí sem nota fiscal a delegacia vai ser ainda mais insuficiente do que já é”. Cláudia ainda destaca que a convivência de um cidadão comum com um criminoso pode de algum modo influenciá-lo.
A ação da polícia para minimizar e inibir o roubo e revenda de celulares consiste em realizar batidas policiais em locais estratégicos a fim de efetivar prisões em flagrante. A DFR, que tem capacidade para 30 detentos, possuía, no último dia 28, mais de 70, sendo apenas 1 por revenda de aparelhos e os restantes por roubos. Todos presos em flagrante.
Feira do Rolo: o paraíso dos “baratos”.
Ir à Baixa do Fiscal, no viaduto do motorista, em um domingo, é ter a certeza de que vai encontrar celulares desbloqueados para todas as operadoras, de todas as marcas e preços. Por todo o decorrer da feira do rolo, como é conhecida a feira-de-rua da região, dezenas de homens, entre aparentes 25 e 50 anos, seguram 2, 3, 4 celulares nas mãos e abordam sua clientela. O preço é negociável: “quanto a senhora dá?” perguntou praticamente todos os vendedores quando a repórter (suposta cliente) reclamava do preço. Aparelhos LG, Siemens, Motorola, Gradiente, Nókia, Sansung, Soni-Ericson, com câmeras, carregadores, desbloqueados, e muitos com cabo saíam pela baratela de 200, 150 e até 100 reais. Modelos um pouco mais antigos chegam a custar 10, 20 reais. O V3, da Motorola (em média 600 reais), “a bola da vez”, como classificou Ana Cláudia, parecia ser um produto de cartel. Não havia nenhum sendo vendido por preço maior ou menor que 300 reais.
A venda informal desses aparelhos prospera de maneira tal que recentemente uma das ruas da feira foi praticamente tomada pelos vendedores de celular, que passaram a disputar espaço com os ambulantes dali. Em toda a extensão da rua 2 de outubro, esses vendedores se espremem e contam as vantagens de seus aparelhos para os clientes: “ele grava 2 horas de vídeo”, “o zoom é muito bom”, “tem FM”, argumentaram.
E, se o vendedor não possui o produto que alguém quer comprar, logo ele grita a marca do aparelho e surgem várias opções. Resta apenas decidir qual tem melhor aparência, porque o preço eles escolheram. Mas uma pechinchazinha talvez ajude. |