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Estudar e morar na capital né mole não

Situação das residências estudantis depende da relação com o poder de prefeitos do interior

 

Wanderson Pimenta
Da equipe de reportagem

 
João Fontoura
Fachada de residência estudantil no bairro Jardim Baiano
 

Truculência, opiniões opostas e desinformação são marcas constantes na relação entre Prefeituras municipais e residências estudantis, segundo apurou a reportagem. Josevan Dutra em seu projeto para o mestrado de Filosofia observa que com a interiorização da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e da Universidade do Estado da Bahia (Uneb), residências dessa espécie tendem a desaparecer, se não houver um forte trabalho de esclarecimento e reconhecimento. Mas o aumento de estudantes nas residências - oito das nove casas visitadas registraram a chegada de novatos - revela que elas ainda serão úteis por muito tempo.

A primeira residência voltada para estudantes do interior que se tem notícia na Bahia, foi fundada pelo Padre Camilo Torrand, em 1961. Essa casa abrigava secundaristas, pré-vestibulandos e universitários de várias cidades e até de outros Estados. Hoje se localiza no bairro do Tororó, funciona regularmente, contando com cerca de 15 estudantes. Também ali está a residência de Itaberaba, fundada em 1970. Possui imóvel próprio há 13 anos e atualmente conta com 33 residentes, entre pré-vestibulandos e universitários. “Possuímos independência em relação à Prefeitura e apesar do prefeito não efetuar o repasse de 1 mil e 500 reais a que temos direito por lei há 15 meses, sobrevivemos fazendo ‘vaquinhas’ e dividindo tarefas”, diz Dhonatan Oliveira, 25. Na casa de Itaberaba o processo seletivo de novos estudantes é feito pelos próprios residentes.

Na rua Futuro do Tororó, vizinha à residência de Itaberaba, encontra-se a casa dos estudantes de Ipirá, também com moradia própria adquirida em 1984, apesar de a residência existir desde 1971. “Possuímos independência política em relação à Prefeitura e uma lei orgânica de 1991 aprovada depois de muita luta na cidade, nos garante o repasse mensal de 0,08% do Fundo de Participação dos Municípios (FPM)”, afirma Sílvio Cerqueira, 26, residente. Segundo Cerqueira, quem pleiteia uma vaga na residência de Ipirá deve participar de uma semana cultural realizada pelos estudantes anualmente em Ipirá, e depois será selecionado em assembléia pelos próprios residentes. A casa abriga hoje 34 estudantes.

5 bairros concentram as residências

As residências estudantis municipais se concentram em sua maioria em cinco bairros de Salvador: Tororó, Nazaré, Barris, Dois de Julho e Saúde. Ainda no Tororó, encontram-se as residências de Xique-Xique e Cafarnaum. A casa de Xique-Xique foi adquirida há mais de 20 anos, doada pelo então prefeito, e contabiliza hoje 45 estudantes. O processo de seleção é semelhante ao de Ipirá e Itaberaba. “Apesar da crise nos anos 90, a nossa situação atual melhorou muito”, diz George Santana, 24, residente. Para Santana, a residência xique-xiquense representa muito: “Se não fosse isso aqui eu não conseguiria manter meus estudos”, afirma.

A mais nova residência municipal em Salvador, de Cafarnaum, abriga 24  pessoas. Fundada em abril de 2006, funciona numa casa alugada. A maioria dos residentes são pré-vestibulandos. Não há processo seletivo, basta o estudante interessado procurar a Secretaria de Educação do município. De acordo com Tomas Barreto, 20, “as contas são mandadas para a Prefeitura e eles pagam”.

O mestrando Josevan Dutra afirma que não há em Salvador residência estudantil que pode ser considerada ideal. Mas existem algumas que se aproximam disso, como é o caso da residência de Itapetinga, que fica na Saúde, da qual o próprio Dutra foi residente em meados da década de 90. “Na casa de Itapetinga nunca houve graves conflitos com a Prefeitura. A casa é própria há 25 anos, possui estatuto que obriga todo prefeito que tomar o poder a manter a residência”, pontua. Outro exemplo é a Casa do Estudante de Paulo Afonso, localizada na rua Odilon Santos, no Rio Vermelho. Conta somente com estudantes universitários - abre-se exceção somente para alunos do CEFET - e abriga  atualmente 25 estudantes em oito leitos. Comprada pela Prefeitura em 1993, possui um coordenador nomeado pelo poder público de Paulo Afonso, mas que não reside na casa. Para morar na residência de Paulo Afonso é necessário  procurar a Secretaria de Educação do município, onde eles avaliam a condição  financeira do candidato, até fazendo visitas à casa dos pais do estudante.

Apertos, desencontros

A residência dos estudantes de Macaúbas, localizada no Jardim Baiano, comporta 70 estudantes, mas está hoje com 80: 45 homens e 35 mulheres. Possui casa própria há 10 anos, mas foi fundada em 1972. A Prefeitura repassa 3 mil reais para a casa mensalmente, para quitação de despesas com água e luz. Mesmo superlotada - 5 estudantes dormem no “chão” -, para o residente Evangelista Santos, a casa de Macaúbas é indispensável: “Isso aqui é uma lição de vida, apesar das dificuldades”, desabafa.

A residência do município de Sátiro Dias está no lado oposto: abriga atualmente 7 estudantes, está em crise, apesar de ter sido fundada há apenas 5 anos. Decidir quem entra na residência é tarefa do prefeito, que paga as contas de água, luz e aluguel. Segundo o residente Renato Silva, 21, “já foi pior”. Os estudantes crêem que o prefeito atual vai dar mais assistência à residência nos próximos meses.

Já na residência dos estudantes de Guanambi (REG), o desamparo é total. A reportagem apurou que desde janeiro de 2005 o prefeito do município, Nilo Coelho, cortou todo o repasse financeiro que mantinha a casa funcionando, sem maiores explicações. Localizada anteriormente nos Barris, os estudantes foram obrigados a mudar de casa, e hoje se encontram na Avenida Sete de Setembro, com aluguel mais em conta, 1 mil reais.

O poder público guanambiense não forneceu garantias para a residência, a não ser cinco meses de aluguel que a Câmara de Vereadores concordou em arcar, de abril a agosto de 2006. Após isso, inúmeras promessas foram feitas pelo então presidente da Câmara, Élder Guimarães. No entanto, segundo os estudantes, até agora nada de concreto. De acordo com os residentes de Guanambi - que hoje são 16 - o contrato de locação estaria vencendo em abril de 2007. Sem a mínima condição de continuar pagando o aluguel, os estudantes temem pelo fechamento da residência que foi fundada em 1975.

Nem Coelho e nem Guimarães foram encontrados pela reportagem para comentar a situação dos estudantes de Guanambi na capital do estado. De ramal para ramal a reportagem encontrava a mesma resposta: ligue para o gabinete. Do gabinete a ligação caiu na assessoria da prefeitura em que um senhor ao ouvir a identificação do repórter perguntou se chovia em Salvador.  Já na Câmara de Vereadores o presidente não se encontrava após sucessivas ligações.

 
 
 
   
 
 
   
   
   
 
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Universidade Federal da Bahia. Jornal da Facom. 2007.