Se a idéia que sobrevém à cabeça da maioria das pessoas ao falar de indivíduos que resistem bravamente na casa dos pais é a daquele vizinho solteirão que até hoje não conseguiu um pé-de-meia ou daquele tio inoportuno que nem pensa em sair do conforto da casa, conheça agora a “Geração Canguru”: os sobreviventes do lar de hoje em dia são independentes, bem sucedidos na carreira, expansivos, promissores e... continuam no aconchego da “bolsa” da mãe.
A advogada Thaís de Carvalho, 33 anos, recebe o suficiente para morar sozinha, mas prefere continuar morando no confortável apartamento dos pais, no Itaigara, bairro de classe média. Diz que sempre se deu “muito bem” com eles e só pretende sair para constituir sua própria família. “Toda vez que falo em sair de casa, minha mãe fica triste”. Ela morou um ano longe dos pais, no município de Ilhéus, sul da Bahia. Não tem problemas em se imaginar morando sozinha, pelo contrário, se diz preparada para enfrentar as dificuldades de ter seu próprio canto.
Para se deparar com um exemplo discrepante, nem é preciso ir muito longe, mas precisamente ao quarto ao lado. Explica-se: o irmão de Thaís, Antônio Lucindo Sobrinho, 27 anos, também divide o mesmo apartamento com os pais, mas ao contrário da irmã, sente-se muito mais ligado a eles. Ele morou um ano em Bauru, São Paulo, para fazer uma especialização em sua área, odontologia. Conta que ligava praticamente todos os dias, aos prantos, “para ouvir a voz dos meus pais”. Mesmo reconhecendo que um dia sairá para constituir sua própria família, e tendo condições financeiras de fazê-lo já, ele enfatiza: “Quero morar perto dos meus pais, pelo menos no mesmo bairro”.
Às vezes, os pais gostam
Nem sempre essa tão adiada partida está associada à formação de uma nova família. Carla Ferraz, 32 anos, trouxe a sua para dentro de casa. Seu filho Ícaro, 8 anos, mora com ela e os avós, em Canavieiras, município a 596 quilômetros de Salvador, também no sul baiano. Ela atua na área de Comunicação do Hotel Transamérica, ganha um salário que cobriria tranqüilamente seus gastos pessoais e os do seu filho em uma outra casa, mas diz não sentir nenhuma pressão para sair da casa dos pais. “Acredito que meus pais gostem dessa situação. Não os vejo vivendo longe do meu filho. Seria muita infelicidade para eles e para meu filho, que é muito apegado ao avô”. Carla, assim como os dois exemplos citados anteriormente, não colabora com as despesas da casa, como luz, água e telefone, somente custeia seus gastos pessoais, tais como celular, gasolina do carro e opções de lazer.
Há casos em que esse prolongamento na convivência familiar pode não se dar com o assentimento dos pais. Darcy Antônio Lucchini, 26 anos, acabou optando por sair de casa depois de uma longa trajetória dividindo apartamento com o pai. Ele atua como técnico de plásticos no complexo da montadora de automóveis Ford, em Camaçari, trabalha desde os 17 anos e então sempre supriu seus gastos pessoais. No entanto, afirma que o convívio com o pai foi se tornando insustentável. “Não era por causa de despesas, a gente se batia de frente por causa de divergências de opinião mesmo”. A solução foi se mudar para uma quitinete, no bairro da Amaralina, onde mora sozinho atualmente.
A psicóloga Maria D’Ajuda Passos diz que, em muitos casos, a presença dos filhos em casa é incentivada pelos próprios pais. “Para alguns pais é conveniente a estadia prolongada dos filhos e o atraso na emancipação individual por motivos emocionais fortes. Porém, cortar os laços e interromper essa adolescência esticada ajuda em muito aos pais na superação do medo de errar e o fim da postura de super-proteção - fatores que, entre outros, levam à eternização da adolescência dos filhos e o fortalecimento da auto-estima”
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