Salvador é conhecida como “cidade de todos os santos”. E não existe título mais apropriado para caracterizar a explosão de casas de videntes, ciganos, “umbandeiros”, espíritas e afins ao redor da cidade. Com os mais diversos tipos de anúncio, que vão desde a limpeza de aura, fechamento de corpo, abertura de caminhos, volta da pessoa amada, fim de frieza sexual e até resolução problemas políticos, a popularidade destes profissionais místicos é mais uma prova do que se pode alcançar com promessas milagrosas e uma boa propaganda.

Mestre Yanko, um dos médiuns mais famosos de Salvador, “conhecido em todo o Brasil e na Europa” (como ele mesmo faz questão de ressaltar), veicula sua campanha publicitária em rádios, panfletos, jornais e cartazes, e tem como marca registrada o slogan: “Mestre Yanko: sempre imitado, mas nunca igualado”. Segundo ele, tudo começou aos sete anos de idade, quando passou a “sentir a presença de espíritos, causar manifestações nos médiuns e ter premonições”. Hoje, aos 30 anos, ele não tem do que reclamar: mora em uma casa com piscina no bairro do Itaigara, dispõe de secretária (sempre vestida com uniforme personalizado), assessora de imprensa, e vive cheio de penduricalhos de ouro.

Pelo valor simbólico de dez reais, Mestre Yanko é capaz de ver o destino do cliente em uma área específica de sua vida, como amor ou saúde. Se a consulta for geral, abrangendo todos os campos, o valor dobra. Em seu escritório, repleto de santos, velas, incensos e algumas cédulas, ele se sente à vontade, inclusive para discutir ao telefone a respeito de sua banheira quebrada ou sobre a chegada de alguns espanhóis que seriam seus clientes em breve. É um dos únicos profissionais de confiança em Salvador, afirma, e o sucesso faz com que atenda pessoas de diversas partes do mundo. Ao fim da consulta com os búzios, o Mestre sinaliza a necessidade de uma limpeza espiritual, que poderia ser feita ali mesmo, por apenas 120 reais.

Outra celebridade mística é Dandara de Yemanjá, taróloga e espírita que também reside e atende em um bairro nobre da cidade. Aparentemente, não apresenta dificuldades financeiras e não lhe faltam clientes – atende uma média de seis pessoas por dia, segundo sua secretária. Em sua garagem, exibe um Toyota Hilux e um Honda Civic, e na sala, uma televisão de plasma de 42 polegadas, o que talvez justifique certo desinteresse em atender e um atraso considerável para as consultas.

Há diversas classificações entre os profissionais da área. Alguns se descrevem como ciganos, outros, espíritas ou pais de santo, sem que se saiba ao certo qual a diferença entre estas especialidades. Eles, no entanto, fazem questão de ressaltar que só fazem traba-

lhos na linha da mesa branca, ou seja, apenas trabalhos para retirar o mal e fazer o bem. Inspirados nas técnicas de marketing, estes profissionais não hesitam em assegurar sua “satisfação garantida, ou o seu dinheiro de volta”.

Residente em uma mansão no Caminho das Árvores, Irmã Lasmin surpreende ao ser vista pela primeira vez. Jovem, loura, barrigudinha e de fala mansa, ela não se assemelha nem um pouco ao imaginário dos videntes, macumbeiros e afins. Na pequena sala em que atende, o tom místico é garantido por todas as costumeiras velas, incensos e imagens, embora o verdadeiro toque especial seja dado por uma galinha sem cabeça atacada pelas formigas e um crânio humano de procedência desconhecida. Depois de receber seus 20 reais, Irmã Lasmin estuda as cartas, a bola de cristal, joga as pedras e inicia sua consulta fazendo agourentas preleções sobre um amigo traidor, uma mulher misteriosa que deve roubar um amado, além de muitos espíritos obsessores. No fim ela oferece um trabalho que deve afastar todas as pessoas ruins e espíritos oportunistas mediante o pagamento da quantia de 370 reais. O dinheiro, Irmã Lasmin insiste em ressaltar, deve servir apenas para pagar os materiais, nunca para benefício próprio.

Direcionada para o lucro, ou não, a renda de videntes como Mestre Yanko e Irmã Lasmin, fica numa média de 4.500 reais mensais, supondo uma quantidade média de seis clientes por dia, de segunda a sexta, e o adicional de três ou quatro trabalhos por semana a um preço que pode variar de 100 a 500 reais, a depender do serviço desejado.

Apesar de extremamente divulgada, este tipo de atividade não chega a ser legalizada. É verdade que existe um artigo na constituição que garante a liberdade de cultos, e até divulgação dos mesmos, no entanto, não são poucos os caso de processos contra esse tipo de profissional. As acusações mais comuns são de charlatanismo, extorsão e até estelionato. Procurados pela reportagem, todos os videntes se recusaram a dar entrevista e todas as informações aqui contidas foram obtidas pelas repórteres na condição de clientes. Contudo, uma coisa é certa: com algum dinheiro, encontrar guias espirituais é fácil, nesta cidade em que todo mundo, e ninguém, é santo.

Trago seu amor em três dias
Gabriela Teixeira
Lis Nogueira