De flanelinha a guardador
Laíla Terso
Silvana Moreira

Corre para lá, corre para cá. O ritmo de trabalho é intenso. Dependendo da região, eles não têm folga. Atenção é fundamental. A todo o momento, um carro sai. A vaga logo é ocupada por outro veículo. Eles orientam as manobras e ainda ficam “ligados” nos que continuam estacionados. Um instante de descuido pode resultar em um arranhão no carro, na rápida saída de um cliente que esqueceu de pagar ou ainda na perda do ponto para um “clandestino”.

Embora muita gente não saiba, a profissão de guardador de carros é regulamentada pela Lei Federal 6.242 desde 1975. Apesar dos trabalhadores não terem direito a férias, décimo terceiro, licença maternidade e até mesmo ao salário mínimo. A maioria dos entrevistados declarou renda mensal de aproximadamente R$250,00, o que requer uma média de trabalho de seis a oito horas por dia.

“Flanelinha não! Eu sou guardadora de carro”. É assim que Juçara Santos da Silva, 39 anos reage ao ser chamada pelos clientes. Ela não é clandestina. Trabalha como guardadora há 14 anos, desde que se separou do marido. Foi influenciada por seu pai, também guardador, e hoje sustenta a família com o que “tira” do serviço. A sua condição de guardadora é a de reserva, ou seja, aquela que cobre a ausência de colegas. Assim, não tem nem ponto de trabalho fixo nem garantias de atividade todos os dias, mesmo sendo registrada e contribuindo com o sindicato.

O presidente do Sindicato dos Guardadores e Lavadores de Veículos Automotores do Estado da Bahia (SINDGUARDA), Melquisedeque de Souza, afirma que os trabalhadores têm direito a assessoria jurídica e assistência médica asseguradas pelo sindicato. O colete usado, obrigatório para todos os registrados, não é cobrado. Em contrapartida, esse profissional tem a obrigação de repassar 50% de tudo o que arrecada, de acordo com um convênio mantido entre o sindicato e a Prefeitura de Salvador. Do percentual arrecadado, o sindicato fica com 10%, além da mensalidade de R$12,00 já cobrada. A Superintendência de Engenharia

de Tráfego (SET) fica com 40% da receita mensal de cada trabalhador. Perguntada sobre o destino da contribuição à SET, a chefe do setor de estacionamento da Gerência de Trânsito (GETRAN), Leonira Santana, garantiu que a arrecadação vai apenas para a compra das cartelas usadas pelos guardadores. Ela também ressaltou o trabalho do órgão na fiscalização dos estacionamentos da Zona Azul, em eventos, na elaboração de escalas e no patrulhamento em toda a cidade.

Para o presidente do sindicato, o guardador que trabalha na zona azul, área regulamentada, perdeu muito o poder de compra. destaca que a taxa está defasada em relação ao serviço de zelar pelo patrimônio particular e à tarifa do transporte público da capital baiana. Hoje, o valor cobrado é de um real, por duas horas; dois reais por seis e três reais por 12 horas. Apesar disso, há motoristas que reclamam. Pedro Alcântara, 59 anos, não acha justa a cobrança, já que o motorista paga determinados impostos e o serviço não é satisfatório, pois o comportamento de alguns guardadores, segundo ele, é agressivo.

Há quem concorde com ele. É o caso da guardadora Viviane Costa, 33 anos, há oito na profissão. Ela declarou que se fosse seu carro não iria pagar. Acha que o pagamento não deveria ser obrigatório. Geralmente, Viviane trabalha no trecho da Avenida Sete de Setembro, nas proximidades do Relógio de São Pedro, e diz que “é horrível, tem muita gente circulando, é difícil ir atrás dos carros”. Perto dali, guardadores dividem o espaço com os flanelinhas (os clandestinos, sem registro no sindicato). Estes, teoricamente, não podem cobrar pelo serviço, embora isso não ocorra.

A procura pela subsistência é apontada em unanimidade como fator decisivo para o ingresso na profissão. “O desemprego tá demais”, lamenta Luiz Carlos dos Santos, 42 anos, guardador há nove anos. Além disso, o aumento da frota de carros em Salvador contribuiu para o crescimento da classe. Segundo Leonira, a cidade não tem vagas suficientes para todos os veículos. Atualmente, são 3.863, com previsão de acréscimo de 1.150 vagas. O que possivelmente irá expandir o mercado de trabalho no ramo da guarda de carros.