Em tais momentos, explica Laura, a parceria com os gerentes gerais de cada filial se resume, por exemplo, à informação sobre a preferência entre as cópias dubladas e legendadas ou entre os gêneros (comédia, drama, etc.) mais consumidos. Baseado nestas preferências, o escritório geral define as grades de cada cidade. A rede, lembra Laura, é uma empresa e, como tal, busca o lucro. Ainda assim, há tentativas de unir o interesse econômico a programas de incentivo à cultura, como o Projeta Brasil, quando, uma vez por ano, o dia é disponibilizado para exibição de uma grade inteiramente nacional, com filmes produzidos no país (projeto sem data determinada para a filial baiana até a data de fechamento da matéria).
Alternativas
Os cinemas de outros shopping centers, como Ponto Alto (av. São Rafael), Lapa (Piedade) ou Barra, estruturam-se em uma ou duas salas que, em sua maioria, exploram a mesma linha de filmes. A diferença, no entanto, se dá em relação aos ingressos que, algumas vezes, chegam a custar menos de um quarto daqueles oferecidos nos grandes complexos. O circuito Sala de Arte, dividido em cinco salas espalhadas entre o Av. Contorno (Cinema do MAM – Solar do Unhão), Vitória (Cinema do Museu e Cinema da Aliança Francesa), Vale do Canela (Cinema da Ufba) e Pelourinho (Cine XIV), procurado pela redação do jornal, não quis colaborar com a reportagem.
As salas Walter da Silveira e Alexandre Robatto, localizadas no prédio da Biblioteca Central dos Barris (Centro da Cidade), ligadas ao Estado, revelam-se as mais cuidadosas com a oferta de filmes. Sob curadoria do jornalista e crítico de cinema Adolfo Gomes, as salas são, como explica, essencialmente responsáveis pela difusão de filmografias inéditas, de difícil acesso para a população ou, sobretudo, sem distribuição comercial garantida. A importância das salas no âmbito cultural se resume quando Gomes, enfático, afirma: “É preciso provocar o público”.
Por limitações de ordem burocrática e financeira, impostas pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que estabelece normas de finanças públicas voltadas para uma gestão fiscal responsável e para o equilíbrio das contas públicas, Gomes admite a dificuldade de articulação com as empresas distribuidoras dos filmes. O incômodo é dado pelo ritmo da administração estadual, pois, a respeito do uso de dinheiro público, a estrutura jurídica do Tribunal de Contas exige o uso de licitações para as movimentações financeiras.
No campo do cinema, como cada obra tem seus direitos detidos por uma empresa específica, torna-se impossível a existência de outras propostas para análise. A série de justificativas que possibilitam a dispensa do uso de licitações consiste em um processo geralmente demorado, ritmo de trabalho que desagrada parte das distribuidoras. Em vista disso, o grande número de articulações com consulados e produções independentes. O estilo de curadoria praticado em ambas as salas se aproxima, como solução, daquele realizada por cinematecas.
Lado B
Não obstante, Adolfo Gomes reconhece que haja carência de cinefilia. O público em geral, como diz, preocupa-se pouco com o que chama de lado B das filmografias nacionais, apegando-se basicamente às obras produzidas dentro do lugar-comum fílmico de cada país, como a comédia espanhola ou a introspectividade francesa. O desdém a esta “outra cinematografia” se estende, ainda, aos diretores pouco conhecidos, como se o público se apegasse aos já consagrados ou “aprovados”. Como conta, boa parte prefere assistir a um filme antigo que já viram e gostaram do que “arriscar” um novo em cartaz.
Considera, por isso, as salas Walter da Silveira e Alexandre Robatto como fundamentais para instigar o público, divulgar o cinema com pouco espaço na cidade (incluindo exibições inéditas) e fomentar a discussão sobre o cinema, como a partir do projeto Quartas Baianas, que aproxima os realizadores de audiovisual baianos do público, em sessões gratuitas, às quartas-feiras, com filmes e vídeos produzidos no estado. A realidade, porém, conforme estudos do MinC, divulgados nos Cadernos de Políticas Culturais, é que apenas 14% dos brasileiros vão, comalguma freqüência, ao cinema; enquanto 60% da população nunca foi a um.
Sobre o consumo de cinema atual na cidade, a situação é contraditória. As salas do circuito alternativo, que oferecem entradas a baixos preços (R$4,00 a R$6,00, na Walter da Silveira) ou mesmo exibições gratuitas (Alexandre Robatto), não conseguem atrair o público, tanto quanto os cinemas do circuito comercial, como salientam Igor Cruz, gerente das salas ‘Walter’ e ‘Alexandre’, e Emanuel Roxo, programador de exposições. A primeira, com capacidade para 200 pessoas, possui um público mensal estimado de 750 espectadores. Já a outra, com 72 cadeiras (não as habituais poltronas), recebe 2700 por mês. Em comparação, a filial da rede Cinemark, em agosto, seu segundo mês de funcionamento na cidade, vendeu pouco mais de 82 mil ingressos, a preços entre R$11,00 e R$17,00.
Quanto à arrecadação da Walter da Silveira (destinada para o pagamento das distribuidoras e para despesas da DIMAS, Diretoria de Artes Visuais e Multimeios da Fundação Cultural do Estado da Bahia, órgão da Secretaria da Cultura e Turismo responsável pela gerência de ambas as salas), oscila fortemente, como entre os meses de Janeiro, R$4.136,00, e Julho, R$1.170,00, deste ano. A diferença se dá por conta das eventuais mostras recebidas pela sala, de entradas gratuitas, ou o fracasso de certos filmes, que não têm um espectador se quer em algumas de suas sessões.
Assim, as salas se mantêm freqüentadas por espectadores cativos em busca de uma diferenciação dentro do panorama de cinemas baianos. Como opina a estudante de psicologia Camila Vilarinho, 19 anos: “a sala ‘Alexandre’, apesar da estrutura física e tecnológica serem limitadas: sala de projeção somente para vídeo – formatos DVD, VHS, MiniDV, DVCam e Betacam com sistema analógico – e poucas cadeiras, cumpre bem seu papel no que diz respeito à ‘qualidade’ dos filmes, como a ‘Walter’. “Gosto porque trazem um conteúdo que não chega ao conhecimento do grande público com a mesma força que as salas comerciais possuem. Há uma melhor qualidade tanto de filmes estrangeiros quanto nacionais”, comenta Camila.