Jornal da Facom  
EDIÇÃO N° 15 - ABRIL 2008
 

EXPEDIENTE

Editoração eletrônica
Fernando Duarte

Assistence de edição/Monitores
Bruno Santana
Fernando Duarte
Cadu Oliveira
Sylvio Quadros

Assistente de fotografia:
Mariele Góes
Fernando Duarte

Assistente de fotografia:
Mariele Góes
Fernando Duarte

Versão Digital:
Anderson Martiniano
Dimas Novais
Lucas Dantas
Luciana Alves
Wilson Fernando

Editor Responsável:
Malu Fontes, professora
DRT-BA 1.480

Produção da disciplina Oficina de Jornalismo Impresso,
semestre 2008.1:

Daniel Mendes, Dimas Novais,
Edna Matos, Filipe Lúcio Costa,
Hugo Leonardo Souza, Ida Sobral,
Karine Libhaber, Laila Crisna,
Lara Tomazini, Lorena Caliman,
Lucas Dantas, Luciana Alves,
Maria Dulce Cruz, Mariana Menezes, Mariana Cavalcanti, Mariele Góes,
Milena Carvalho, Míria Lima,
Nicole Bianchi, Paula Cristina Boaventura, Paula Janay, Priscila Dau, Renta Inah, Rodrigo Aguiar, Samuel Barros, Sarah Corral, Savana Caldas, Vanessa Ramos e Wilson Fernando

Diretor da Facom(2005-2009):
Professor Giovandro Ferreira

Reitor da UFBA (2006-2010):
Professor Naomar Almeida Filho

Tiragem: 5.000 exemplares

E-mail:
jornalfacom@yahoo.com.br
Endereço: Rua Barão de
Geremoabo, s/n, Campus de
Ondina
CEP: 40170-115
Salvador/Bahia

 

VARIEDADES

Um mestre no Pelourinho

Precursor de ritmos fala sobre carreira, alegrias e dificuldades em manter projeto musical
Wilson Fernando

Com 55 anos de carreira tocando nas mais famosas bandas de percussão da Bahia, como Olodum e Ilê Aiyê, Valter Aragão França, mais conhecido por “Mestre Prego”, mantém ainda uma paixão quase inesgotável pela música percussiva. Ele organiza e administra um projeto cultural no Pelourinho, onde ensina a tocar instrumentos de percussão e dá noções de cidadania a crianças e adolescentes. Os seus 65 anos de vida não caberiam num só livro. Numa entrevista, então, cabem apenas minúsculos episódios. Ele recebeu o JF em casa, no Pelourinho, quando acabava de chegar de uma “tocada” no Elevador Lacerda.

Jornal da Facom - O Pelourinho já era celeiro musical
há 55 anos?
Mestre Prego - O Pelourinho não tinha essa
beleza que a música proporciona hoje. O
Olodum foi um fruto que deu certo, e a partir
daí a cara do Pelourinho mudou. Lembro que
a primeira banda que vi aqui era a Embaixada
Mexicana, onde os homens saíam em fila.
Desde então, segui esse bloco. Naquela época,
a gente pagava para sair tocando, não tinha
esse negócio de hoje. Era por amor mesmo.

JF - Após 55 anos vivendo entre repiques, surdos e baquetas
ainda dá para viver de percussão, não cansa?
MP - Cansa pouco, mas quando a gente gosta...
Quando a gente vê amizade, calor humano
e trabalho a gente continua. Existem muitos
momentos bons, mas outros momentos
são amargos.

JF - E esses momentos amargos, quais seriam?
MP - Já fui enganado por entidades carnavalescas
de alto nível. Em Dias d’Ávila, uma
vez, fui tocar num lugar que não tinha nem
água. Outra vez fui tocar no carnaval num
bloco de índios, e fui caluniado pela diretoria.
Disseram que eu agredia um integrante. Só
ficou melhor quando saí desse bloco.

JF - Existe diferença entre a percussão de hoje e a
daquela época?
MP - Mudou muito. Ela revolucionou. Quem
tocava era chamado de batuqueiro. Hoje é
chamado de percussionista ou musicista. Eu
nunca pensei em ver gringo por aqui filmando,
nem gente que viu a banda na Europa ou
no Japão. Tem muito japonês que me conhece
de lá por vídeos.

 

JF – O senhor disse que a música não deu dinheiro
nessa época. E hoje a percussão dá dinheiro?
MP - Hoje está melhor. Antigamente as escolas
de samba não davam dinheiro e o que
davam era para comprar pano. Depois que
recebi a ajuda do governo, na década de 80,
eu pude conseguir um espaço para montar
meu projeto. Só comecei a ter sucesso através
dos meus filhos. Começamos a tocar
com Daniela [Mercury] em 1990. Meus filhos
“Buiú” e Valdenilson participaram da música
“Todo menino do Pelô sabe tocar tambor”.
Eles viajaram com ela por vários países. Ela
nos fez bem e nós fizemos bem a ela, mas
hoje isso não é mais assim.

 

JF – O senhor é uma figura ilustre do Pelourinho. O
senhor se considera assim?
MP - Eu me considero orgulhoso da vida.
Tenho orgulho de ser abraçado e beijado
aqui. Sou rico de amizade. Não digo que
sou melhor que fulano. Eu sou considerado
entre os grandes músicos. Não sei de onde
vem isso.

 

JF - Existe algum assunto
em sua casa que não seja
relacionado com a música?
MP - Rapaz, aqui o assunto
é só música. Tem
muita criança e adolescente
do projeto aqui,
só falamos disso.

 

JF - Onde é a sede do projeto?
MP - Hoje não tem
sede. Tínhamos um casarão aqui no Pelourinho,
mas como era invadido, tivemos que
sair. Alguns amigos políticos conseguiram
alugar uma casa pra mim até conseguir esta
casa aqui no Pelourinho, onde funciona
também a sede do Grupo Cultural Meninos
e Meninas do Pelô.

 

JF - O Grupo Cultural Meninos do Pelô recebe
algum tipo de ajuda?
MP - Antigamente a gente recebia. Mas de
uns tempos para cá, o governo tem dado
prioridade à cultura que menos precisa, que
já tem estabilidade. Pagam artistas de fora
para tocar, sem que eles tenham uma história
aqui. Antes era doce, mas ficou amargo.
Mas como a vida não é só doçura, ficamos
tocando ali e aqui e assim
continuamos.

 

JF - Quem ajuda a manter
o projeto?
MP - Algumas empresas
de turismo e uma
do governo ajudam
com cem, duzentos reais
de vez em quando.
Elas também ajudam
com cestas básicas e
equipamentos de som. Além disso, vivemos
das tocadas que nós fazemos.

 

JF - Quantas crianças são atendidas?
MP - Aproximadamente, 60 crianças e adolescentes
fazem parte do projeto.

 

JF - Além de ensinar percussão, tem outros projetos
para eles?
MP - Temos muitas atividades, ensinamos
dança, fazer trança, futebol, basquete, vôlei,
eletrônica, culinária, alfabetização e reforço
escolar. Tem muita gente no Pelourinho que
não sabe nada. A mente deles fica fechada e
eu não agüento ver criança usando drogas.
Já perdi muitas crianças que hoje se acabam
na droga. Por isso, vou escrever para o governador
pedindo uma ajuda quanto a isso,
na questão do transporte, da manutenção
do projeto para continuar a ensinar percussão
a elas.

 

JF - Seria possível imaginar o Pelourinho sem o estampido
da percussão hoje em dia?
MP – Fica ruim. O pessoal já está acostumado.
Se você for a outro lugar, talvez outro
tipo de música faça sucesso, porque o povo
de lá já se acostumou. Mas o Pelourinho está
acostumado com a música percussiva. Mas
o Pelourinho é um shopping musical, onde
tem de tudo. É igual a procurar petróleo,
se você procurar você acha. E eu contribuí
com isso porque fui o primeiro a ensinar a
percussão aqui. Apesar de ter entrado muita
coisa nova, a percussão ainda é importante.
Tudo é costume.